Post by Dislei Sousa on Jun 28, 2015 19:33:53 GMT
Resumo
A Proficiência em Leitura e Escrita: Os Dados Oficiais e os Dados Reais
Raimunda Dias Duarte
Considerações Iniciais
A Proficiência em Leitura e Escrita: Os Dados Oficiais e os Dados Reais
Raimunda Dias Duarte
Considerações Iniciais
Nos últimos anos o ensino-aprendizagem de língua portuguesa tem sido ponto de avaliação, com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que afirmam que o aluno precisa concluir a 4ª série hoje 5º ano com pleno domínio da leitura, escrita e cálculo, eles precisam ter habilidades e competências de compreensão, interpretação e produção de textos autênticos. Visando relacionar os documentos oficiais e a realidade em sala de aula, DUARTE (2009) coordenou um projeto de pesquisa ‘O Papel da linguística na formação do professor das séries iniciais: leitura e escrita’ no período de 2009 a 2011, no Campus Universitário do Baixo- Tocantins, com o objetivo de analisar o ensino-aprendizagem de algumas escolas da região. A pesquisa começou com a análise de três classes de séries iniciais e entrevista com 20 professores que atuam nessa fase de escolarização. Nesse estudo a autora apresentou resultados de três escolas de Abaetetuba, Moju e Igarapé-Miri fazendo uma articulação inicial dos professores com sua prática pedagógica. O trabalho tem como referencial SMOLKA (2003) e BAKHTIN (1988) que consideram a linguagem como atividade discursiva. Ao término da pesquisa foram comparados os dados oficiais e a relação da formação inicial do professor com sua prática docente.
Algumas Considerações sobre Leitura e Escrita
A tradição gramatical considera a leitura e a escrita apenas como formas de decodificação e de reprodução de palavras e frases soltas. Esta concepção de alfabetização que é repassada em muitas escolas é utilizada de forma contraditória e fragmentada. Divergindo desta concepção de ensino os Parâmetros Curriculares Nacionais- PCN afirmam que produzir linguagem significa produzir discurso. Significa dizer, portanto, que a linguagem se realiza dentro de uma situação concreta de interlocução social em que se diz algo a alguém de uma forma específica dentro de um contexto histórico, com intenção comunicativa. No momento da interação social as crianças interagem por meio de textos autênticos, argumentam, questionam, persuadem com o objetivo de comunicar-se, levando em consideração o outro dentro de uma situação comunicativa. Este mecanismo de ensino permite ao professor inovar seu método de ensino e contribui para um melhor entendimento das situações concretas da fala.
Os Dados Oficiais
Em 2005, o Ministério da Educação (MEC) criou metas bienais de qualidade de ensino, preocupado com o índice de proficiência em leitura, escrita e cálculo das escolas brasileiras (tanto no ensino fundamental como no médio) que era muito negativo. Os indicadores de Língua Portuguesa dos alunos de 4ª série se concentravam nos estágios crítico e muito crítico. Diante do problema o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) criou o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), por meio da qual é avaliada, de dois em dois anos, a proficiência em leitura, escrita e cálculo das escolas brasileiras. A intenção do índice é ajudar a melhorar a qualidade da educação em todas as esferas educacionais. O IDEB tem por meta a aprovação e média de desempenho dos estudantes em língua portuguesa e matemática e é baseado em notas de provas como a Prova Brasil. Até o ano 2022, a meta do Brasil é alcançar à média 6,0, correspondente à qualidade do ensino em países desenvolvidos. Os resultados da pesquisa nas escolas do estado do Pará, com foco em Abaetetuba, Igarapé- Miri e Moju, municípios do Baixo- Tocantins demostram resultados positivos com relação aos índices da pesquisa. Os indicadores parecem mostrar que a criança brasileira está finalmente se tornando proficientes em leitura, escrita e cálculo, principalmente se esses resultados forem comparados com os dados que motivaram o MEC a criar, em 2005 metas bienais de qualidade de ensino para as escolas brasileiras. Mas diante destes resultados surge a questão: Esse crescimento dos índices reflete realmente a realidade das crianças brasileiras? As crianças estão efetivamente, se tornando proficientes em leitura e escrita na mesma proporção em que os índices oficiais parecem apontar? Essas questões nos fazem refletir sobre a realidade dos alunos dessas escolas do Pará.
Os Dados da Pesquisa
Os resultados dos indicadores de proficiência em leitura e escrita apontam para resultados positivos. Contudo, ao fazer um trabalho nas escolas municipais de Abaetetuba, Igarapé- Miri e Moju, Duarte percebeu que a realidade dessas escolas é diferente dos resultados apontados nos indicadores. Os alunos que estão cursando a 4ª série ainda não conseguem, sequer, compreender um texto (produzir, nem pensar!). Muitos alunos que cursam a 2ª e a 3ª séries tem muita dificuldade até de decodificar palavras. Diante desta realidade é apresentado o contraste entre os dados oficiais e as pesquisas in loco em escolas do Baixo-Tocantins. Os cálculos do IDEB das escolas municipais têm como uma das referências o rendimento escolar, que é mensurado por meio das aprovações escolares. Então, quanto maior for o número de aprovações nas escolas municipais, maior será a possibilidade e aumentar o IDEB. Essa referência é duvidosa, pois a provação não garante ao aluno, um rendimento satisfatório. O aluno pode tornar-se proficiente em leitura e escrita. Para que o rendimento escolar sirva como referência para o IDEB, precisa estar vinculado ao ensino-aprendizagem da linguagem como atividade discursiva. Esse fator deve levar em consideração não apenas o que o aluno aprende, mas também o que o professor ensina.
O que é ensinado nas escolas
Através de pesquisas foi diagnosticado que a língua que se está ensinando nas séries iniciais de escolas públicas de Abaetetuba, Igarapé-Miri e Moju dificilmente tornará os alunos proficientes em leitura e escrita, como exigem os PCN. O estudo da língua privilegia formas gramaticais, definições mecânicas, o ensino isolado e descontextualizado de letras e palavras sem critério científico, sem embasamento teórico- metodológico em estudos do texto e discurso. Os alunos de uma classe do 3° ano em aula de leitura e escrita decoram palavras e frases soltas e em atividades de produção de texto recortam textos em diferentes tiras e depois montam como se fosse um quebra-cabeça. Em outras escolas as aulas de “leitura e escrita” não são diferentes desta realidade. Por meio dessas atividades, pode-se perceber que há uma concepção equivocada de leitura e escrita. A leitura é vista apenas como forma de decodificação, de memorização mecânica. A escrita consiste na reprodução de palavras e frases soltas. Esse tipo de atividade não garante ao aluno desenvolvimento nas práticas de leitura e escrita. Logo, nesse contexto, a aprovação do aluno no final do ano não é um critério seguro para medir a proficiência em leitura e escrita. Antunes (2007: 122) defende que “nos conformamos com aulas que não priorizam a produção, a leitura e a análise de textos lidos e escritos”. Quando fazemos isso perdemos a capacidade de perceber que só aprendemos a ler lendo, analisando o que se lê, tirando conclusões, levantando hipóteses, etc.; só aprendemos a escrever, escrevendo, revisando, escrevendo de novo, cortando palavras, substituindo ou acrescentando outras, fazendo e refazendo, enfim (ANTUNES, 2007, p. 122). É importante que se faça uma reflexão sobre o ensino de leitura e escrita nas séries iniciais para que se compreenda o tipo de saber que os alunos precisam para se tornarem capazes de refletir e produzir textos autênticos.
A Formação Docente
O que se observa na realidade escolar sob análise é que não se está apenas diante de questões de aprendizagem. Há de se refletir também em concepção de ensino, haja vista que existe um eixo indissolúvel chamado ensino-aprendizagem. Portanto, não se deve avaliar a linguagem desvinculada do ensino. No projeto de pesquisa de Duarte (2009) foram feitas entrevistas com 20 professoras para investigar a formação inicial das professoras que atuam nas séries iniciais nos três municípios do Baixo- Tocantins. Por meio das entrevistas foi possível perceber que na formação inicial dessas docentes não havia nenhuma atividade curricular que pudesse instrumentalizá-las para o ensino-aprendizagem da leitura e escrita como atividades discursivas. A realidade é confirmada quando são analisados desenhos curriculares de cursos para formação de professores de duas universidades públicas que têm campus na região do Baixo- Tocantins. Nessas universidades, apenas 2% a 4% das atividades curriculares têm alguma relação com ensino-aprendizagem da leitura e escrita. Isso representa, em termos numéricos, quando muito, uma ou duas atividades curriculares. Diante desta realidade surge a questão: Como o professor das séries iniciais poderá trabalhar o ensino- aprendizagem de língua portuguesa de forma proficiente sem ter em sua formação inicial conhecimentos teórico-práticos da área da linguística, cujo objeto de estudo é a própria linguagem? Se os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) bem como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) defendem que o aluno precisa concluir a 4ª série com o domínio da leitura, escrita e cálculo, isso “coloca necessariamente um novo papel para o professor das séries iniciais: o de professor de Língua Portuguesa” (PCNs, 1997). Não se trata de delegar a tarefa do ensino aos profissionais de Letras ou concentrar o ensino nas esferas da leitura, escrita e cálculo, como muitos equivocadamente interpretam ou defendem determinados pontos de vistas para criticarem a orientação oficial. Trata-se, antes, de se repensar sobre que saberes são importantes aos professores que atuam nas séries iniciais precisa “repensar sobre o ensino da leitura e da escrita considerando não só o conhecimento didático acumulado, mas também contribuições de outras áreas” (PCN, 1996). A apropriação da leitura e escrita pelo aluno é um processo altamente complexo, por isso exige do professor competência técnico-pedagógica específica, a fim de que questões relacionadas a essas práticas de uso da língua sejam tratadas adequadamente. Os conhecimentos da área de estudos da linguagem, certamente poderão trazer relevantes contribuições para a prática dos professores que atuam nas séries iniciais. Já na sua formação inicial, o professor precisa ter uma base sólida para tratar funcionalmente da leitura e da escrita.
Algumas Considerações para Reflexão
Avaliar a proficiência em leitura e escrita implica muito mais do que computar números, resultados, indicadores. Implica, principalmente, avaliar que concepção de linguagem subjaz ao ensino-aprendizagem de língua portuguesa na escola; implica entender o que se espera do aluno quando se preconiza que ele seja proficiente em leitura e escrita e que conhecimento se exige do professor para que este possibilite ao aluno o domínio da leitura e da escrita como práticas discursivas. Sabe-se, contudo, que o processo de ensino-aprendizagem proficiente da leitura e da escrita não se limita às questões levantadas neste trabalho. Está relacionado, sobretudo, a questões de ordem política, econômico-social, as quais fogem do domínio da escola, da sala de aula e, principalmente, do professor.